Desequilíbrio na distribuição de vacinas contra Covid afeta municípios mineiros.

Prefeitos de MG reclamam da metodologia empregada, considerada ultrapassada, e como a decisão afeta os índices de mortalidade nas cidades Por CINTHYA OLIVEIRA E LETÍCIA FONTES.

Desequilíbrio na distribuição de vacinas contra Covid afeta municípios mineiros.
Por O Tempo

O processo de distribuição de vacinas promovido em Minas Gerais tem gerado uma grande insatisfação por parte de prefeitos e pessoas que necessitam do insumo para se protegerem do coronavírus. Para muitos, há interesses na metodologia adotada para a distribuição do insumo entre os municípios. 

Quem olha para o Vacinômetro da Secretaria de Estado de Saúde (SES-MG) percebe que cidades com perfis populacionais parecidos estão recebendo quantidades de vacinas contra a Covid bem diferentes. A secretaria explica que os números são baseados em dados relativos aos grupos prioritários, mas ainda assim as distorções não ficam claras. Embora seja a quarta maior cidade de Minas Gerais, Juiz de Fora foi a segunda em número de vacinas recebidas – atrás apenas de Belo Horizonte. O município da Zona da Mata obteve 266.991 doses, enquanto Uberlândia, que tem cerca de 100 mil habitantes a mais, recebeu 225.238 unidades.  

Juiz de Fora tem realmente uma população idosa maior do que muitas das grandes cidades mineiras. Por lá, 9,5% da população tem mais de 60 anos, de acordo com dados do DataSUS. Em Uberlândia, os idosos correspondem a 7,13% dos moradores. Mas isso seria suficiente para explicar uma diferença de 41.753 vacinas entregues entre os dois municípios?  

Para o presidente da Associação Mineira de Municípios (AMM), Julvan Lacerda, os dados utilizados para a distribuição são defasados. Um dos critérios utilizados pelo Estado são as projeções realizadas pelo Instituto Brasileiro de Geografia Estatística (IBGE), que leva em conta levantamentos feitos em 2012, entregue ao Tribunal de Contas da União (TCU). "A fonte de dados para fazer esses levantamentos é furada, o IBGE não é atualizado, os dados em todos os sistemas, sabemos que não tem a devida alimentação. Fazer o planejamento em cima desses dados é inseguro", argumenta Lacerda.   

A situação tem incomodado prefeitos, que acreditam que o desequilíbrio na distribuição de vacinas tem feito a letalidade em cidades menos abastecidas ser alta. Alguns dos municípios que, proporcionalmente sobre a população, receberam menos doses apresentam altas taxas de mortalidade por Covid. Em Ribeirão das Neves, na região metropolitana, para onde foram enviadas somente 77.933 doses, a taxa de letalidade é de 3,6%, conforme levantamento do professor de Estatística do Centro Universitário UNA Bráulio Couto.  Em Governador Valadares, na região do Rio Doce, a taxa é de 4%; em Contagem, também na região metropolitana, 4,2%; e, em Betim, na mesma região, 3,7%. "Estamos constantemente questionando esses critérios, mas as explicações não são suficientes, porque falam que os critérios são a faixa etária e a população com comorbidade, mas a base de dados não é confiável", pontua o presidente da AMM.   

Para se ter uma ideia, em Betim, a prefeitura recebeu 380 doses da vacina anti-Covid para imunizar os profissionais das forças de segurança. O município, no entanto, possui 1.500 profissionais cadastrados. Segundo o secretário municipal de Saúde, Augusto Viana, entre os profissionais da saúde, 2.500 pessoas ainda aguardam a imunização por falta de vacinas.   

"O Estado orienta que os municípios sejam ágeis na aplicação, informando que aqueles que mais aplicam receberam mais vacinas, mas isso é apenas um discurso. Betim tem condição de fazer muito mais no processo de vacinação. Temos infraestrutura logística e de armazenamento, mas esbarramos na desproporcionalidade da distribuição dos imunizantes, algo que não está no nosso controle", explica o secretário, ressaltando que, atualmente, o município apresenta média de 77% de aplicação das vacinas com relação ao número de doses recebidas. O índice está entre os cinco melhores do Estado e acima da média estadual e nacional, que apresentam 73,1% e 72,6% de aplicação, respectivamente.   

Essas discrepâncias fazem com que o ritmo de vacinação seja diferente nos municípios. Em Belo Horizonte, até mesmo os jovens com comorbidades estão sendo vacinados, enquanto em Betim o esquema vacinal ainda está priorizando o grupo na faixa de 43 a 48 anos. "Estamos tentando entender esse critério, seja pela eficiência da aplicação, seja pelo fator populacional. Betim representa 2,09% de toda a população do Estado, mas recebeu apenas 1,32% de vacinas proporcionalmente à população. Isso gera um déficit de 67 mil doses a menos. A população das regiões metropolitanas possui perfis e características semelhantes. É o mesmo perfil de idosos, crianças. Não queremos achar que essa distribuição discrepante seja de caso pensado", completa Viana.   

Segundo ele, é preciso maior empenho do governo de Minas. "Eu vejo poucas ações concretas do Estado diante do governo federal. Vemos isso na quantidade de vacinas e no número de leitos credenciados e de kits de intubação recebidos", completou.