Poder de compra das famílias some diante da escalada de preços

Inflação desumana é mais um componente perverso desta pandemia

Poder de compra das famílias some diante da escalada de preços
Além de todos os problemas que a pandemia traz, Cristiane Moura ainda enfrenta a alta de preços Foto: Fred Magno

 

Por CINTHYA OLIVEIRA

07/04/21 - 07h30

No momento em que o Brasil vivencia o momento mais grave da pandemia de Covid-19 e uma taxa de desemprego acima de 14%, as famílias ainda têm de lidar com uma inflação desumana. Junto ao medo do adoecimento, os brasileiros precisam cortar custos, criar novas formas de renda e mudar hábitos de consumo para conseguir fechar o orçamento doméstico. Não segurar a alta de preços em um momento tão dramático pode ser sinônimo de falta de empatia com o ser humano.

Os gastos com combustível, alimentos, medicamentos, educação, gás de cozinha ou plano de saúde cresceram bastante ao longo da pandemia, deixando as famílias com poder de compra cada vez menor – reduzindo a circulação de dinheiro pelo país e alimentando o círculo vicioso da recessão.

A alta de preço é generalizada, sendo um ingrediente amargo na pandemia. O gás de cozinha, por exemplo, já subiu 22,7% neste ano. A gasolina encareceu 54% de janeiro até agora. Planos de saúde e medicamentos ficaram cerca de 8% mais caros em média. Já o metrô de Belo Horizonte teve recentemente a tarifa reajustada em 5,9%.

Se pegarmos o período da pandemia, mais precisamente entre a segunda quinzena de março de 2020 e a primeira de março deste ano, o IBGE aponta que os alimentos tiveram um peso assustador no bolso do brasileiro. O aumento médio foi de 14%, com absurdos como a alta de 84,22% do óleo de soja, 69% do arroz e de 31% de alguns cortes de carne.

Mas essa inflação alta poderia ser contida com o controle da pandemia, segundo o professor Felipe Leroy, do Ibmec Minas. “Normalmente, uma inflação acontece quando há muita gente querendo comprar e pouca gente querendo vender. Mas nesse caso as empresas estão impossibilitadas de vender. Seja por causa das medidas de restrição ou porque uma fábrica teve 20 casos de Covid entre seus funcionários, por exemplo”, afirma.

A alta do dólar, que encarece do óleo de soja à gasolina, também cria um impacto em toda a cadeia produtiva e, consequentemente, no preço final ao consumidor. “Isso provoca um aumento da pobreza. Este é o pior cenário econômico de nossa história, e não consigo ver solução a curto prazo”, argumenta.

Para que a economia volte a crescer e a inflação tenha menor impacto na vida das famílias, Leroy acredita que deveria haver um investimento grande na vacinação. “O governo federal deve ampliar os convênios para conseguir uma produção nacional de vacinas. Porque o governo está quebrado, não tem mais como injetar dinheiro nos bolsos das famílias. O novo auxílio é apenas uma solução paliativa”.

Para muitos brasileiros, os problemas causados pela Covid e pela inflação são intercalados. A família da comerciante Cristiane Silva Moura está tendo de fazer muito malabarismo para conseguir manter a saúde e as finanças em dia. O marido dela pegou Covid em janeiro e ainda está em tratamento, porque ficou com um pulmão comprometido, e o filho foi diagnosticado com lúpus. “Só de medicamento do meu menino são R$ 1.600. Fora o convênio médico, que não dá para ficar sem”, conta.

Com a distribuidora de materiais de festa fechada, o jeito é conseguir uma renda com os dotes culinários. “E assim a gente paga uma conta hoje quando entra dinheiro e deixa a outra para depois. Os comerciantes não tiveram auxílio, ficaram desamparados”, desabafa.

DESEMPREGO AUMENTA O DRAMA DAS FAMÍLIAS

Aline Camilo trabalhava com brechó, mas perdeu o emprego logo que a pandemia chegou. O sustento da família ficou nas mãos do marido, que trabalha como chapeiro em uma hamburgueria, mas a situação se agravou quando ele se acidentou e precisou fazer uma cirurgia no joelho. Após três meses de afastamento, ele ainda não recebeu o auxílio-doença, e a família passou por muito aperto. “Tive que contar com a família. Um irmão pagou uma conta da casa, uma irmã me deu uma cesta básica”, relata Aline.

Ela ainda vende peças de roupas usadas em grupos de WhatsApp, mas o ganho não é suficiente para pagar as contas. “Isso ajuda para comprar pão e leite. Mas tenho amigas que estão em situação pior, estão trocando peças de roupa por comida porque estão passando fome”.