Alta de preços força mudança de hábitos dos brasileiros

Alta de preços força mudança de hábitos dos brasileiros
Foto: Arquivo Pessal

 

 

 

 

Por ANA LUIZA BONGIOVANI

 


Alta de preços força mudança de hábitos: imagem 1

Foto: Arquivo pessoal

Na casa da professora de inglês Isabella Magalhães, 27, a lista de compras na hora de ir ao supermercado sempre foi farta. “A gente costuma consumir algumas marcas específicas, principalmente de produtos como arroz, feijão e óleo. Mas, com o aumento dos preços, estamos procurando as opções mais baratas”, afirma. Os doces, biscoitos e outros supérfluos agora ocupam uma parte menor da despensa: “Estamos com muito mais consciência na hora de fazer as compras”. 

 

Com a alta do preço da cesta básica em 7,41% no ano passado, conforme dados da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas Administrativas e Contábeis de Minas Gerais (Ipead), essa mudança de hábitos na hora de consumir os alimentos não foi uma exceção. Passou a ser regra de sobrevivência. 

Para a dona de casa Luciana Ambrósio, 46, moradora de Ribeirão das Neves, na região metropolitana, cada centavo desses aumentos fez diferença na conta do mês e aumentou a aflição na hora de fazer as compras. 

Mãe de um adolescente com deficiência, Ethan Gabriel, 14, que se alimenta por meio de uma sonda, ela tem precisado se virar para manter a despensa abastecida. “Eu tenho gastado sola de sapato indo atrás das promoções”, brinca ela, diante da tentativa de economizar, também no combustível. “No hortifrúti, que é a maior parte da alimentação dele, com R$ 100, eu antes ocupava uma mesa inteira com as compras. Hoje, é metade da mesa. Eu não posso deixar faltar de jeito nenhum, mas não está sendo com tanta fartura quanto costumava ser. A gente tem que ficar procurando oferta, não dá pra comprar em um lugar só”, explica. 

A fome, a falta de alimentos em quantidade suficiente, é considerada uma situação de insegurança alimentar grave, se envolve crianças, ou moderada, se atinge apenas os adultos de uma casa. Só que a necessidade de escolher alimentos de menor qualidade para garantir que todos os moradores terão o que comer também pode caracterizar a insegurança alimentar – mas em grau leve. Segundo estudo da Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar (Rede Penssan), houve aumento de 14 pontos percentuais nesse tipo de caso, que atinge também as famílias que não estão em condição de pobreza. 

Com a alta dos alimentos in natura, acaba aumentando o consumo dos ultraprocessados. “Não é falta de alimentos, mas, com pouco recurso, não dá pra se alimentar adequadamente. As pessoas acabam adquirindo comida ultraprocessada. A indústria de macarrão instantâneo, por exemplo, comemorou a alta das vendas. Temos, então, um cenário de desnutrição, porque as pessoas passaram a comer o que não tem nutriente”, alerta Renata Siviero, presidente do Conselho de Segurança Alimentar e Nutricional Sustentável de Minas Gerais (Consea-MG). 

Sem a alimentação adequada, aumentam ainda os índices de doenças, como diabetes, hipertensão e obesidade, que podem resultar em consequências mais danosas à saúde de quem já está em situação de vulnerabilidade.

Enquanto isso, para se optar por uma dieta saudável, é preciso estar com a saúde financeira em dia. Segundo o Boletim Hortigranjeiro, divulgado pela Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), o quilo de alface nas Centrais de Abastecimento de Minas Gerais (Ceasaminas), por exemplo, passou de pouco mais de R$ 4 para R$ 6,52. Só entre os meses de dezembro e novembro, o aumento foi de 74,2%. O quilo do tomate também subiu no período, passando de R$ 2,50 para R$ 4,10. Entre as frutas mais consumidas, o quilo da laranja foi de R$ 1,82, em média, para R$ 2,14, enquanto a melancia subiu de R$ 1,59 para R$ 2,45. 

Agricultura familiar é opção 

A agricultura familiar, com o consumo de alimentos em pequena escala e modos de produção artesanais, é uma das alternativas apontadas por especialistas para garantir a segurança alimentar, considerando principalmente que o conceito também prevê a sustentabilidade econômica e do meio ambiente na produção dos alimentos. 

No país, a maior parte da comida que chega à mesa dos brasileiros já é fruto da agricultura familiar, mas ainda é possível ampliar este volume. Em Coronel Xavier Chaves, na região do Campo das Vertentes, Maria Teresa Boari e o marido começaram recentemente a produzir queijo Minas artesanal. “A gente não entendia nada quando começou. Eu vinha de processos, e meu marido da informática. Se não fossem as ajudas que tivemos, no início, das empresas públicas e universidades, nós teríamos desistido”, diz. 

A receita deles já foi premiada em um concurso estadual da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Estado de Minas Gerais (Emater-MG), mas Maria Teresa avalia que ainda precisa de mais incentivos para que o negócio se torne sustentável financeiramente. “Hoje, nós fazemos o queijo durante a semana. Aos domingos, fazemos doce de leite. E temos ainda galinhas caipiras. A produção ainda pode crescer, mas, da forma como estamos, é bem apertado. O dinheiro que conseguimos tirar nós reinvestimos todo aqui”, conta. 

Minas Gerais tem, ao todo, 441 mil estabelecimentos rurais voltados para a agricultura familiar, o que corresponde a 72% do total do Estado. Há mais de 1,8 milhão de pessoas ocupadas com esse tipo de atividade. Para o diretor técnico da Emater-MG, Gelson Soares Lemes, a atividade é importante para o agronegócio e para a economia mineira como um todo, além de poder proporcionar a segurança alimentar de todos os envolvidos. 

“A agricultura familiar tem como característica ser muito diversificada e estar presente em todos os municípios de Minas. Um pequeno sitiante tem leite, frutas, hortaliças. Às vezes, também uma criação de peixes e explora o mel”, afirma. Entre as funções da Emater estão a consultoria técnica e o auxílio na gestão das atividades