Gravidez tardia: entenda os riscos, os prós e os contras

Segundo dados do IBGE, cada vez mais brasileiras optam por ter filhos depois dos 35 anos; mulheres adiam a gestação pela rotina intensa ou por outras prioridades

Gravidez tardia: entenda os riscos, os prós e os contras
Foto: Priscila Jamma/Divulgação

 

Por LETÍCIA FONTES

 

Cada mulher tem a sua história, e com a maternidade não poderia ser diferente. Para a atriz e roteirista Alessandra Colasanti, ter filhos nunca foi um sonho. A decisão da maternidade, inclusive, sempre foi adiada por questões de trabalho. Mas, aos 40 anos e solteira, a dúvida veio.

“Sempre pensei muito em relação a ser ou não ser mãe. Me perguntava se seria um desejo real meu ou um condicionamento social. Oscilava de tempos em tempos entre querer e não querer. Fui obrigada a me decidir e passei a desejar muito”, conta a atriz, que engravidou naturalmente aos 45 anos. Hoje, Alessandra é mãe de Nuno, que vai completar sete meses este mês. 

Assim como a atriz, cada vez mais brasileiras optam por ter filhos mais tarde. Se no passado a idade média em que as mulheres engravidavam era entre os 20 e 30 anos, hoje isso mudou. Mulheres estão adiando a gestação, seja pela rotina intensa ou por prioridades, como a carreira, e até por saber que poderá contar com a ajuda extra da medicina. No caso de Alessandra, ela chegou a cogitar congelar os óvulos, mas não foi preciso. 

“Não foi uma escolha ser mãe mais tarde, foram os rumos da vida. Minhas prioridades eram outras antes, e não aconteceu. Não mudaria nada na minha vida; chegou no meu momento, portanto o momento certo. Nunca quis ter filhos como mãe solo, para mim sempre foi um projeto conjunto, eu precisava de um companheiro que quisesse construir essa realidade  comigo. E esse companheiro demorou a chegar”, afirma a atriz, que não se arrepende da maternidade “madura”, como gosta de chamar.

“Para mim, a grande vantagem é não me sentir tanto em dívida com a minha profissão por estar cuidando do meu filho. Essa dicotomia é muito penosa para as mulheres que investem em suas carreiras. Mas eu já dediquei uma vida inteira à minha carreira, cansei, agora me sinto livre pra ser mãe à vontade”, desabafa. 

Provando o ponto de vista de Alessandra, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), formar uma família não é apenas uma questão de fertilidade. Nem a pressão social, familiar ou o relógio biológico.

De acordo com o instituto, é cada vez maior o número de mulheres que decidem ser mães após os 30 anos. Em 2019, 37,5% das mulheres que engravidaram já tinham ultrapassado essa idade. Entre 2009 e 2019, aumentou em 63,6% o número de mães na faixa etária entre 35 e 39 anos. As estatísticas mostram ainda que, entre os 40 e 44 anos, a alta no número de partos foi de 57% e, entre 45 e 49, o aumento foi de 27,2% na comparação. Já entre as mulheres com mais de 50, o crescimento foi de 55% no mesmo período.

Para o ginecologista Marco Melo, especialista em reprodução humana da clínica Vilara, não há dúvidas de que a fertilidade natural vai diminuindo progressivamente ao longo da vida, mas histórias como a de Alessandra se repetem entre a maioria das mulheres que adiam a gravidez. No auge da vida profissional, o bom mesmo seria se essa resposta estivesse no Google. Mas a matemática e o relógio biológico são implacáveis.

“É uma tendência mundial. Cada vez mais as mulheres postergam esse momento, por priorizar o estudo ou o profissional. Algumas se casam mais tarde, querem aproveitar essa fase com o marido, querem ter uma vida econômica estável. Em 2020, muitas mulheres congelaram óvulos para poderem engravidar em um período que consideram mais adequado. Cada uma tem o seu momento, mas, para muitas, isso é uma angústia quando elas se aproximam dos 40 anos e veem que as chances diminuem”, explica o especialista. “Biologicamente falando, a idade mais adequada é até os 35. A chance de ter complicações é menor”, acrescenta o médico.

Mas fazer 30 anos, embora seja um marco para toda mulher, é também uma idade envolta em algumas crises. Uma delas, e a mais difícil, é qual o melhor momento para se ter filhos, como analisa a psicóloga e mestre em neurociência Amanda Margarida Oliveira. “É preciso entender que escolher algo sem abrir mão de uma série de outras coisas é ilusório. Por muito tempo entendeu-se a função social da mulher como a de reprodução e cuidado da prole, assim, ser mulher era ser mãe. Isso se repete até hoje. No consultório, mulheres não mães próximas dos 30 têm o sentimento de atraso pelo não alcance da maternidade”, explica a especialista. 

“A mensagem de que a gravidez ‘tardia’ é inadequada é clara e está por toda parte, e não precisa ser direta, é uma mensagem subentendida. Toda mulher teme ter um filho com alguma espécie de deficiência. Essa questão da deficiência é muito mal elaborada na nossa cultura e é também um tabu. Acho que precisamos refrescar o olhar e o coração para essa questão, mas, ao mesmo tempo, enxergo a existência de um terrorismo médico que parece crucificar a mulher que opta por ter filhos mais velha. Para mim, claramente, é fruto do machismo da nossa sociedade que prega que a função social da mulher é procriar”, questiona Alessandra Colasanti.

Quanto mais velha, mais perigoso

De acordo com especialistas, conforme aumenta a idade da mulher, crescem os riscos de doenças na gravidez e de anomalias congênitas no bebê. Segundo Marco Melo, especialista em reprodução humana, o maior problema é a qualidade dos óvulos. Estudos mostram que uma mulher de 35 anos tem 15% de chance de engravidar a cada mês, por cada ciclo menstrual. Em uma de 40, essa chance cai para 5% e 7%. Entre os 43 e 45, a chance é de 1% ao mês.

“Uma gravidez tardia implica maiores riscos de diabetes gestacional, hipertensão, tudo isso ligado à prematuridade. Os bebês podem ter alterações cromossômicas, ocasionando problemas no desenvolvimento”,  explica o médico. 

Mas Melo tranquiliza. As dificuldades naturais em engravidar e os riscos podem ser minimizados com cuidados com a saúde e exames que identificam possíveis mutações genéticas nas células reprodutoras. Ele afirma ainda que há diversas opções para que a maternidade seja realizada. Uma mulher que se decida pela implantação de embrião, por exemplo, tem 50% de chance de ter um filho.

“Podemos trabalhar com o congelamento dos óvulos e embriões, o que vai prevenir a qualidade e a quantidade dos óvulos. Tem outras técnicas que são fertilização in vitro e o estudo genético embrionário, em que você estimula a ovulação e depois faz um estudo dos embriões que não possuem alterações cromossômicas, que diminuem a chance de abortamento e malformação”, afirma o médico. Os procedimentos variam de R$ 6.000 a R$ 10 mil. 

“Se você não tem perspectiva de ter filho agora, recomendo que se congelem os óvulos em torno de 33 anos para não ter dificuldades no futuro. Se engravidar naturalmente mais tarde, não tem problema, os óvulos estão lá guardados. Não existe receio ético em descartar. É melhor se arrepender de ter feito do que de não ter feito”, completa o especialista, que lembra, no entanto, que a idade máxima para as mulheres que desejam se submeter às técnicas de reprodução assistida é de 50 anos, segundo o Conselho Federal de Medicina. “Não se proíbe gravidez depois dessa idade, mas não se recomendam tratamentos, porque a mortalidade materna é alta”. 

Alternativas.

Outras opções são a doação de óvulos e a barriga de aluguel, que no Brasil são permitidas, desde que não haja fins comerciais e se enquadre em alguns critérios. Mas a psicóloga clínica Luciana Rocha alerta: solteiras, viúvas, transexuais, casadas; o estado civil e a orientação sexual não importam quando o assunto é maternidade. “É preciso separar a escolha por pressão social e por desejo próprio. É fundamental conhecer os motivos por trás da sua escolha. Ser ou não ser mãe não passa por um lugar de certo ou errado, mas sim por um lugar de desejo. Ser mãe independe de uma gravidez, existem tantas formas, como adoção”, exemplifica. 

Mudanças

Homens. Não são só as mulheres que sofrem os efeitos do tempo. Segundo especialistas, homens também têm sua fertilidade diminuída após os 35 anos. E, assim como acontece com as mulheres, à medida que os pais têm filhos mais velhos, maior é a chance de os bebês nascerem com problemas. 

Casamentos. E não é só a maternidade que tem sido tardia. Em 1998, a idade média em que as mulheres se casavam no Brasil era de 23 anos. Dez anos depois, a média subiu para os 28 anos, segundo o IBGE.

Benefícios. Não precisa desanimar. É verdade que alguns estudos mostram que às gestações acima dos 35 anos está associada a maior incidência de síndrome de Down e outras doenças congênitas, mas a boa notícia é que ser mãe mais velha pode aumentar a expectativa de vida. Um estudo realizado na Escola de Medicina da Universidade de Boston, nos Estados Unidos, mostrou que mulheres que tiveram seu último filho depois dos 33 reúnem maior probabilidade de viver até os 95 anos. E tem mais: uma pesquisa realizada na Universidade de Aarhus, na Dinamarca, provou que mães acima dos 35 anos educam seus filhos com menos castigos e menos violência verbal, o que repercute no bem-estar e no emocional dos pequenos.