Economia: O que Lula e Bolsonaro deveriam, mas não vão debater no 2º turno

Economia: O que Lula e Bolsonaro deveriam, mas não vão debater no 2º turno
Lula e Bolsonaro dividem votos de artistas brasileiros — Foto: Reprodução/Twitter

 

Por Simon Nascimento

 

Jair Bolsonaro (PL) e Luiz Inácio Lula da Silva (PT) disputarão voto a voto no 2º turno das eleições até o dia 30 de outubro. Mas a polarização extrema entre os dois candidatos deve retirar da corrida eleitoral assuntos importantes da pauta econômica da mesa de debates. Neste cenário, retomada do crescimento eco

nômico, geração de emprego, redução do déficit das contas públicas, responsabilidade fiscal, privatização de estatais e teto de gastos tiveram pouca relevância até então e devem se manter apenas nos planos de governo cadastrados no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). 

A avaliação é de economistas entrevistados pela reportagem de O TEMPO nos últimos dias, já projetando um acirramento da comparação entre os feitos econômicos e sociais de cada presidenciável como destaque nos embates. Professor associado da Fundação Dom Cabral, Paulo Paiva cravou que as questões fundamentais econômicas sobre o futuro do Brasil deverão ser ignoradas para dar lugar, principalmente, às propostas de programas de transferência de renda. 

A temática, inclusive, é argumento recorrente de Bolsonaro ao exaltar o pagamento de R$ 600 no Auxílio Brasil e atacar os valores pagos por Lula ao extinto Bolsa Família. O petista, por sua vez, reforça o discurso nostálgico da época de ascensão social durante 2002 e 2010, quando ocupou a cadeira presidencial. “Os candidatos não estarão olhando a responsabilidade que terão a partir de janeiro diante de um cenário externo desafiador. Não vão disputar quem tem maior racionalidade na gestão econômica, disputarão quem fez mais benesses, quem deu mais e quem deu menos. Quem ajudou aqui e ali”, sustentou Paiva, também ex-ministro do Trabalho, Planejamento e Orçamento no governo Fernando Henrique Cardoso (PSDB). 

O docente lembrou o risco de recessão internacional e o acirramento da guerra entre Rússia e Ucrânia como pontos de atenção externa e que podem ter impactos na economia brasileira. Outro apontamento do economista como carta fora do baralho é o orçamento de 2023. Com um rombo previsto de R$ 400 bilhões, o texto enviado para avaliação do Congresso tem cortes de receita em programas sociais importantes. No Farmácia Popular a contenção foi de 59% da verba, enquanto o Alimenta Brasil recebeu uma ‘tesourada’ de 97%. 

 

“O orçamento que está no congresso é inexecutável”, alertou o especialista que lembrou também a exclusão dos debates a autonomia do Banco Central. Sancionada em fevereiro de 2021 por Bolsonaro, a medida tira do presidente o poder de controle da inflação e da taxa de juros, por exemplo. “O que vai estar na mão do presidente é apenas a política fiscal. A política monetária vai ser dividida com o Banco Central. É um dilema que não está na disputa e nenhum dos dois vai tocar nesse assunto”, complementou. 

 

Na mesma linha, o economista e gerente geral do Ibmec BH Márcio Salvato diz que falta ao debate a apresentação de propostas que tratam de crescimento econômico estável, controle inflacionário e do ônus de se elevar a taxa básica de juros - alçada a 13,75% pelo Banco Central. “Quais são as políticas de curto, médio e longo prazo para fazer uma aceleração do crescimento econômico? E obviamente quando se propõe isso é preciso dizer qual é o custo, se tem dinheiro, de onde virá esse recurso, se vai ser preciso expandir o gasto público, fazer alguma parceria público-privada ou fazer mais privatizações para arrecadar fundos”, assinalou Salvato. 

A gestão das empresas estatais, inclusive, deve surgir timidamente na agenda de debates, segundo o economista do Ibmec. Nos planos de governo, Lula e Bolsonaro divergem de privatizações. A pauta é vista de maneira positiva pelo atual presidente e candidato à reeleição como forma de impactar o crescimento econômico, enquanto Lula tem visão distinta. “É um assunto que deve aparecer no segundo turno, e é bem notório a diferença entre os dois candidatos. Há uma clara diferença entre esquerda e direita e tem público para os dois lados, é um assunto de interesse dos dois eleitores”, afirma. 

Emprego de fora 

Em um cenário de recuperação da taxa de desemprego no país, atualmente em 8,9%, a geração de novas oportunidades de trabalho no Brasil deveria ser pauta prioritária dos candidatos, segundo Fernando de Holanda Barbosa Filho, mas está escanteada. Pesquisador e economista sênior da área de Economia Aplicada do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) da Fundação Getúlio Vargas, ele afirma que a ampliação das oportunidades profissionais está diretamente ligada à retomada do crescimento econômico no país. 

“Enquanto não conseguir gerar crescimento econômico sustentável, você não vai gerar emprego nas condições necessárias e de forma acelerada. Para isso precisa de uma consolidação fiscal, zerar o déficit que a gente tem há 8, 10 anos. A gente não tem um superávit primário estrutural condizente com a dívida e enquanto não se resolve o problema, é difícil gerar empregos em qualidade e quantidade”, assinalou Holanda. 

Na proposta da lei orçamentária foi enviada ao Congresso Federal no final de agosto, o Ministério da Economia estimou um déficit primário de R$ 63,7 bilhões no próximo ano. O valor é quase o dobro do prejuízo registrado em 2021 e está acima da previsão feita pelo Ministério da Economia, de R$ 59 bilhões, para este ano. 

Teto de gastos continua? 

Implementado em 2016 pelo então presidente Michel Temer (MDB), o teto de gastos públicos, além de não integrar os debates, também é dúvida a partir de janeiro de 2023. Contrário à limitação, Lula já sinalizou pela revogação da medida. Bolsonaro, por sua vez, defende gastos conscientes e efetivos do orçamento público, indicando a continuidade do teto no documento oficial cadastrado com as propostas no TSE. 

O presidente, no entanto, ultrapassou os limites orçamentários em mais de R$ 40 bilhões para custear a PEC Kamikaze antes do início da campanha eleitoral com o aval dos deputados e senadores.